sábado, 10 de abril de 2010

lágrimas (d)e céu

Por cima das nossas cabeças: o céu. Por cima das nossas cabeças, encostadas uma à outra como se se tratassem de almas siamesas as nossas, o céu, nocturno mas estrelado, a monotonia do negro quebrada por milhentos pontos cintilantes cujo escrutínio rigoroso levaria horas infinitas. Poderíamos estar deitados ao ar livre sobre a relva fresca ou a areia molhada de uma praia qualquer que esse céu por cima das nossas cabeças não pareceria mais pleno ou genuíno.
Na verdade, estamos estendidos sobre a velha carpete da sala e acima de nós o tecto é branco e desinteressante, mas isso é apenas o modo como me lembro desse momento, memórias imagéticas de como as coisas foram de facto - e do que vale ser-se de facto quando a forma como sentimos é completamente diferente? -, nada tendo que ver com o modo como vivi, evoco esse momento e convoco essa banda sonora.
Lembrar, é disso que se trata, afinal: memórias. Memórias que já nem sei se partilhas, memórias que eu própria já nem sabia possuir e cujo significado já não sei qual é. De qualquer modo, queria que ficasse claro que ainda me lembro. Não que isso valha de alguma coisa, devesse ou sequer que fosse meu desejo que valesse mas... Mas se eu te dissesse o que me vai hoje na cabeça, que música soa ininterruptamemente na minha jukebox, gostava que acreditasses. Embora aposte que não, não é possível aceitares a coerência dos meus actos, palavras ou lembranças, depois de tantas coisas feitas, desfeitas, ditas, desditas, construídas, destruídas. Aposto que não acreditarias. Mas ainda assim gostava de ter coragem para te dizer que ainda há momentos em que algo dentro de mim funciona a mil à hora quando algo que cai do céu me lembra de ti.
Neste momento é uma música, gostava que soubesses qual. Fala de céu e paraíso, de um tu e de um eu, hipotéticos, irreais, impossíveis. Só queria saber se ainda ousarias dizer o meu nome ou agarrar-me a mão se me visses por aí, porque e mesmo sabendo que tem que ser assim, que fui desterrada e não pertenço mais a esse lugar. Esse céu por cima das nossas cabeças, onde tu estás, e para onde se evaporam, quer queira quer não, as lágrimas que solto. Recebe-as e pensa no que significam. Guarda-as como prova nº 1 do que quiseres. Só não deixes que chova e que o céu desabe todo sobre a minha cabeça.

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