quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

entre portas e janelas

Foi numa tarde de Primavera, e estava calor em todo o lado, excepto na entrada dos prédios da minha rua. Mentia se te dissesse que não estava à espera, ou que foi sem querer, ou que me arrependo, e sei que também seria mentira se tu o dissesses. Dias depois, embora fosse Junho, choveu – e voltou a acontecer – outra, outra e outra vez, em dias de chuva e de sol, durante um mês. Quis parar. Na verdade, não queria ser eu a acabar com tudo, queria simplesmente que acabasse, antes que fosse tarde de mais. Quis parar mesmo antes de ter começado, embora nunca me tenha arrependido – de nada. Quis parar porque tive medo; mas tu prometeste que não nos ia acontecer nada e eu acreditei, ou fingi acreditar, porque era mais bonito assim, mais completo. Já nessa altura havia nas tuas promessas o irresistível pecado de acreditar, uma, duas, mil vezes, contra todas as evidências, naquilo que te propunhas a dar-me, quer fosse um beijo, uma estrela, a lua e o mundo ou, simplesmente, dar-te a mim. E, embora nunca me tenhas prometido a eternidade, ao longo dessas semanas cálidas, fui recolhendo nas tuas frases, nos teus telefonemas sussurrados a meio da noite, nos teus beijos, as palavras, ditas em voz alta ou escondidas numa carícia, necessárias para criar a promessa que nunca cumpriste e que, penso eu, nem nunca chegaste a fazer: “Fico contigo até deixares de precisar de mim.”
Certo dia, foste-te embora. Mandaste-me à merda e gritaste comigo, no meio da rua; e eu nem sequer tive culpa de não te amar quando devia ou de me ter vindo parar à frente dos olhos as duras, cortantes verdades que tu não querias que eu descobrisse. Foste-te embora e, sabes uma coisa? Eu ainda precisava de ti. Nunca me esqueço do abraço que me negaste nessa noite nem daquele que te pedi, dias depois, entre umas escadas que desciam para a praia e umas que subiam para a realidade, o abraço que queria que me desses para eu poder guardar e assim fechar uma porta da minha vida: a que dava acesso a ti.
Assim como não me esqueço do “despede-te de mim” que ordenaste na porta do elevador do meu prédio, e da forma como eu impedi a porta de se fechar, atirando com o meu braço direito contra ela, enquanto te dava o resto do meu corpo, entre lágrimas e soluços. Ou das vezes que me voltaste a encontrar na entrada do mesmo prédio da tarde de Junho, ou no mesmo elevador, ou no escuro de uma sala que só agora comecei a olhar com novos olhos, os olhos do que “podia ter acontecido”. Assim como não me esqueço do difícil que é deixar-te sempre e a cada vez e do quase impossível que foi ir-me embora da última vez, do atroz que foi deixar fechar aquela porta, entre beijos e abraços e regressos e retornos e “adeus, adeus outra vez, adeus mais uma vez”. Do mesmo modo que não me esqueço das frases feitas que fomos retirando da nossa caixinha dos romantismos ao longo dos últimos meses: “aquela estrela é para ti”, “dá-me um abraço para eu guardar”, “eu sei ler os teus olhos”, “queres que fique?”, “tenho medo”, “não me deixes ir”, “não vás”. Não vás. Abrimos e fechámos tantas vezes as mesmas portas que acabaram por emperrar. Hoje, peço-te apenas que me deixes um espaço na tua vida, por uns tempos, só até eu encontrar outras portas para abrir. E peço-te que me deixes entrar, só de vez em quando, mesmo que seja pela porta dos fundos, mesmo que seja por uma janela qualquer.

1 comentário:

Mariana disse...

é tão engraçado como há coisas que nos passam ao lado,como o que eu só percebi com este texto,e como já te tinha dito. Obrigada e desculpa babuu